segunda-feira, maio 29, 2017

Sebastião nunca fez uma selfie
(e agora que viu o que os olhos do pai vêem, talvez Juliano o compreenda e aceite melhor)



Fotografar o fotógrafo. Perceber o que vê quem vê. Reconhecer que a fotografia retrata o fotógrafo, mais do que o fotografado.

Tal como ver quem pinta. Tentar perceber como surge o que antes não existia. Acaso? Persistência?

Ou quem escreve. Escreve como? A que horas? De onde surge a ideia? Do mundo real? De sonhos?

E quem esculpe. Descobrir de onde vem a vontade de retirar o material que sobra. Da vontade de moldar a natureza? Do mero gosto em mexer nos materiais?

E os que fazem filmes? Como se forma a ideia? Como o concebem? De olhos fechados, imaginam as sequências, os cenários, as falas?

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Não é preciso tentar perceber a motivação de Juliano, tentar descobrir como nasceu o filme que ajudou a fazer. O Sal da Terra. As razões foram muito concretas e bem pessoais. 


O pai ausente não era perdoado pelo filho, as personalidades chocavam. Os de fora louvavam mas aquele em cujas veias corria o sangue do seu sangue apenas sentia a falta do pai. E, em casa, um irmão com sindroma de Down. E o pai preocupado com as crianças de outras geografias.


Até que, já homem feito, resolveu conhecer os mundos que cativavam o pai, tentar perceber as suas ausências, as suas causas que a tudo pareciam sobrepôr-se.

E, então, Juliano viu. Viu as crianças, a pobreza extrema, a tocante ingenuidade, a beleza suprema da natureza em estado puro, os intocáveis horizontes -- tudo o que enleava o pai e de onde ele regressava com imagens nunca antes antevistas.


O filme não é novidade, terá já uns dois anos mas hoje apeteceu-me ver Juliano e Sebastião juntos a falarem da sua vida em família, tão marcada pela devoção de Sebastião Salgado à fotografia.




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E, se vos apetecer descansar o espírito, queiram fazer o favor de descer e meditar um pouco na No Regret Farm onde as cabrinhas são fisioterapeutas do corpo e da alma.

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