sábado, setembro 23, 2017

As praxes, os condutores de caloiros, o poder, a humilhação, a paródia acéfala e etc





Durante toda a santa semana, em vários locais de Lisboa, deparei-me com grupos de estudantes. Uns importantes, certamente sentindo-se superiores na sua capa e batina, alguns de kilt, conduzindo bandos de caloiros. Estes, uns de tshirt com números, outros todos sujos evidenciando que andaram a rebolar-se na terra, outros de penico na cabeça a fazerem exercícios ridículos.


Quando andei na faculdade não havia praxes. Mesmo que as houvesse, eu não me sujeitaria a elas. Quer como veterana, quer como caloira, números destes incomodam-me. Nem gosto de me armar em superior, ordenando sevícias ou bacoquices -- nem me sujeito a ser mandada como se fosse membro de um rebanho ou envergonhada por quem se inicia no gozo do exercício do poder.

A coisa mais parecida com isso a que me sujeitei, e foi porque achei graça, foi a um julgamento. Quando morei numa residência universitária, havia esta coisa. Numa noite, juntavam-se as veteranas, a direcção da residência e alguns convidados e, uma a uma, cada nova habitante era sujeita a um interrogatório, tendo que responder ou, em alternativa, recebia a pena e tinha que a cumprir, mas a pena era uma coisa divertida. Quando calhou a minha vez, todas em volta e o júri na mesa, o que me calhou foi explicar como se arranja um namorado em menos de 24 horas. Na altura eu tinha um namorado que agradava muito às minhas colegas de residência e a quem eu tratava com algum desprendimento e, ao mesmo tempo, tinha uns quantos pretendentes que, just for the fun of it, eu não me importava que gravitassem à minha volta. E, quando elas me chamavam açambarcadora, eu dizia que não, que eles é que não me largavam mas que, se assim não fosse, eu também não teria dificuldade em arranjar alguém que quisesse namorar comigo. Ora uma coisa é uma pessoa brincar entre amigas e outra é ver-se rodeada por dezena de pessoas, num ambiente de julgamento, e pôr-se a dar uma aula de sedução. Mas dei. No fim aplaudiram. E espero que tenham aprendido alguma coisa.

Foi engraçado. Não foi humilhante.


Agora ver adolescentes de bacio na cabeça, a fazerem palermices, a serem conduzidos pela rua como carneiros... é coisa que me incomoda. Fico a pensar nos adultos que serão. 

Ou isto das praxes não quer dizer nada? Vale tudo porque, de facto, não vale nada? Ou já nada quer dizer alguma coisa? Nada vale alguma coisa?

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A fotografia lá em cima, da autoria de Matthias Schrader e que vi no The Guardian, mostra pastores da Baviera conduzindo os seus rebanhos.

A música é de Ry Cooder, banda sonora de Paris, Texas, filme que vi long ago e que estou, neste momento, a rever, imitando um Leitor a quem agradeço a dica. 

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