sábado, maio 20, 2017

A menina está à janela... mas contrariada que só visto.




Pensava que a esta hora podereria andar a varrer o chão à volta da casa ou a pintar a parte de baixo dos bancos de pedra enquanto o meu marido pintaria a parte de cimento por baixo dos telheiros por cima das portas ou as paredes por debaixo mas, para meu espanto, o trabalho ainda não está acabado. Pior, estão cá agora a trabalhar o que me impossibilita de andar meio despida, a meu gosto. Com um calorão destes. Nem me dá jeito estender-me numa espreguiçadeira a ler um livro com eles por ali a cirandar. Sempre isto. Ou é porque choveu ou é porque um teve que ir não sei onde ou porque sei lá o quê. E eu a pensar que hoje já poderia ter cá a criançada toda. Não os tive por outros motivos mas, se pudesse ter sido, haveria de ter sido lindo: por todo o lado ainda montinhos de tijolos, telhas, gravilha, areia, cimento, restos disto, daquilo e do outro e os andaimes à porta de casa ainda montados. Caneco.


O meu marido arrelia-se comigo por eu me arreliar, diz que eu estou farta de saber que é sempre assim. Mas arrelio-me na mesma porque não percebo. Uma falta de ritmo e de planeamento que transtorna. Umas coisecas de nada e andamos nisto há que tempos, Hoje tinha a ver com a altura do banco, que era preciso eu confirmar. O meu marido volta a arreliar-se comigo: 'Se não tivesses que dar palpites sobre tudo...'. Palpites como!? Ele esclarece-me: 'Deixa-o fazer à vontade dele. Vê lá se ele a mim me faz perguntas dessas.'. Olha. Disparate. Faça aqui um banco de pedra -- faço desenho, digo medidas, digo tudo. Mas se o chão tem que ser um bocado elevado, já tenho que reconfirmar tudo, não conseguem discorrer por eles...? Ainda por cima, discorrem e está sempre certo. Para quê esperar para eu confrmar? Claro que se surgisse um imprevisto que fosse alterar a lógica da coisa, faria sentido esperar pela confirmação, agora assim... São desculpas, só pode.


E hoje era ainda mais outra. Já no outro dia foi o mesmo. Não cortou o ramo que vai para cima do telhado do outro lado e que deixa lá ficar montes de carumba porque era melhor confirmar com a senhora, porque a senhora é muita agarrada às árvores. O meu marido furioso comigo: 'Até para cortarem a porcaria duma pernada de uma árvore têm que ter a tua autorização.' Claro. Os homens têm mais bom senso que ele que se for preciso e só para que a conversa não se alongue diz simplesmente: corte tudo. Felizmente não o levam a sério. Ele zanga-se. Com tanta porcaria que cai para cima do telhado, a água nem consegue escorrer. Muito bem. Mas uma coisa é perceber quais as pernadas críticas e cirurgicamente actuar só aí e outra é atalhar cerce: 'Corte tudo'. Não tem paciência, credo, chateia-se de chegar cá e tê-los ainda por cá e, só para evitar isso, por ele ia tudo a eito.

Enquanto escrevo, ouço-os. Estou na sala a escrever e eles estão à porta da cozinha. O meu marido anda de tronco nu, com uns calções de praia velhos. Quer ir adiantando nas pinturas, pôr primário onde puder. Falam da retoma na economia, de como isso se sente no trabalho que lhes pedem. O electricista que veio pôr um candeeiro de célula numa parede em vez do que antes estava suspenso do telheiro e no qual o meu marido e o meu filho volta e meia batiam com a cabeça (também não sei como, aquilo não devia estar a menos de um metro e oitenta e tal, digo eu) diz que os preços estão muito esmagados, que o pessoal anda contente porque trabalho agora não falta e esquecem-se de olhar para o que sobra ao fim do mês. O meu marido diz que deve haver cada vez mais concorrência, que no outro dia se admirou por ver que em Lisboa, numa obra, o pessoal da construção era todo espanhol (ou, pelo menos, falava espanhol). 


Agora veio dizer-me que a lata de tinta que trouxémos, convencidos que era tinta branca, afinal é azul alentejo. Lindo serviço. É o que dá fazermos compras quase às dez da noite e cheios de fome. Diz que vai ver se na casinha de arrumações há alguma tinta branca, senão vai ter que ir à vila comprar. Ai minha mãezinha. Só visto.
Aliás já fui ver para perceber como foi tal possível. A lata é igual, apenas tem uma etiqueta com a cor da tinta. Nem nos demos conta de tal, pensámos que eram todas brancas. Que burrice, caraças.
Adiante. Nada a fazer. Logo invento uma pintura qualquer para aproveitar o azul alentejo.

Para me entreter, e uma vez que não estou com disposição para ler mas, sim, para mandar vir, andei aqui a tirar fotografias dentro de casa. Lá em cima é aquela borboleta de que no outro dia falei, está defunta para cima de há uns seis anos e eu ali a tenho, toda formosa, como se estivesse na flor da idade. Hoje fotografei-a sobre uma taça de cerâmica que é como se fosse um lago com tartarugas à volta. Como vêem, aqui em casa é só disto. 

Bem, vou parar com esta conversa mole, que isto faria sentido se o blog fosse o meu querido diário e não uma coisa lida por quem deve ficar a achar que não estou boa da cabeça para estar a maçar com tretas que não interessam a ninguém.


Em homenagem à tinta azul alentejo e ao facto de estar aqui enfiada em casa em vez de andar lá fora a jardinar, deixo-vos com 'Menina estás à janela' pelo Vitorino.

E, então, até mais logo.

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1 comentário:

bea disse...

Pronto, já desabafou. Mas como é que uma borboleta defunta dura tanto tempo e para que raio a quer aí entre esses dois sapos que, peço desculpa, me parecem sem graça nenhuma. Bom. Mas cada um tem em casa o que tem e às vezes também o que quer.

Ainda bem que o seu azul alentejo está em sua casa que se um sovina que conheço o visse, bem lho pedia e ficava com ele; aguava-o quanto pudesse e pintava as barras do monte de uma ponta à outra.

De resto, a menina estás à janela é bonita canção alentejana.