quarta-feira, abril 13, 2011

Espanhóis, franceses, holandeses, japoneses, marroquinos, israelitas, noruegueses, belgas, alemães .... como é trabalhar e negociar com eles (pelo menos, de acordo com a minha experiência)

Ao longo da minha vida profissional tenho trabalhado com pessoas de vários países. Ao fim de algum tempo foi-me possível estabelecer um padrão nos respectivos comportamentos.

Numa altura em que se vêem tantas comparações entre Portugal e outros países apetece-me acrescentar aqui a minha opinião pessoal sobre os traços mais comuns nas pessoas de várias nacionalidades.

Espanha

Já aqui referi por mais do que uma vez a má experiência que tive com as várias equipas de espanhóis com quem tive oportunidade de me relacionar profissionalmente. Como há diferenças significativas entre regiões, refiro que os meus contactos foram essencialmente com pessoas de Madrid e de Barcelona. Tirando o caso uma pessoa que era da zona de Santander e com quem não houve nunca qualquer problema, e tirando o caso de pessoas que estavam integradas em multinacionais e alinhadas com as práticas dessas organizações, os restantes eram pouco evoluídos a nível de gestão e mesmo tecnológico, desorganizados, trabalhavam sem planeamento e, sobretudo, eram pouco reliable.

Combina-se uma coisa, inclusivamente por escrito e, passado algum tempo, se lhes convém, dão o dito por não dito, fazem o contrário, protelam, sonegam, subvertem o que foi combinado. E, se lhes parecer oportuno, dramatizam, fazem grandes cenas, depois pedem desculpa: um desatino.

São aquilo a que pejorativamente costumamos designar por ciganos.

No entanto têm ‘olho para o negócio’, há neles um certo pragmatismo, é aquilo que costumamos designar por não olhar a meios para atingir os fins, sacrificam a moral e a ética se lhes parecer que tirarão proveito disso.

Em qualquer negócio em que entremos com eles, sairemos provavelmente a perder pois somos mais certinhos, temos mais escrúpulos.


França

Que me recorde, franceses, lidei sobretudo com o director comercial de um Grupo e com o vice-presidente de uma grande trading multinacional. Este último, para além de um enorme charme tinha grande capacidade de liderança e uma maneira de se apresentar incomum nestas funções, coisa que a sua alta estatura e elegância no porte permitia (calças de bombazine, gola alta, blasers de tweed, cabelo relativamente comprido). Mas, se a amostra de duas pessoas pode ser considerada significativa, direi que são simpáticos, afáveis, relativamente ligeiros, relativamente informais.

Devo, no entanto, referir uma situação. É costume ouvir dizer-se que os franceses não se lavam. Pois bem, isso não sei mas que o director comercial com quem tive numerosas reuniões cheirava sempre a transpiração é um facto. Nunca consegui perceber. Mesmo quando as reuniões eram de manhã, já ele me cheirava desagradavelmente. Talvez fosse um problema de saúde e não de higiene.


Bélgica

Uns senhores, um certo comportamento de fidalguia. Nem muito aguerridos, nem muito persistentes mas um certo ascendente pela palavra, um posicionamento tradicional, e uma amabilidade cortês embora reservada ou mesmo um pouco distante.


Holanda

Talvez os mais parecidos connosco. Simpáticos, descontraídos, apreciadores do convívio, do turismo, da boa vida, uma afabilidade coloquial. Mas minuciosos nas contas, não se incomodando de discutir aquilo a que os portugueses chamam negligentemente de trocos. Com a mesma naturalidade com que falam de grandes negócios, decompõem o grande em pequeno e vão a cada pormenor. Não dão nada de barato e nisso fazem a diferença.


Japão

Talvez dos mais diferentes de nós. Procuram produtos especiais e pagam de acordo com isso, ou seja, pagam preços elevados e dispõem-se a suportar os elevados preços de transporte. São de uma minúcia às vezes exasperante pois querem ter a certeza de que lhes dizemos tudo e que percebem tudo, perguntam e tornam a perguntar, uma prolongada troca de correspondência, querendo compreender detalhes por vezes difíceis de explicar.

Gostam de sentir que se está a fazer uma coisa especial para eles, gostam de sentir que temos um cuidado especial naquilo que fazemos para eles. De vez em quando deslocam-se em bando para reuniões para conhecer as pessoas com quem se correspondem, para ver como se fazem os produtos, querendo ver tudo com um pormenor desconcertante.

Como se sabe, dão prolongados apertos de mão, sorrindo, acenando com a cabeça e riem-se muito.

Aconteceram-me com eles algumas situações que tenderíamos a classificar de desagradáveis mas que me apercebi que são basicamente particularidades culturais.

É frequente, a meio das negociações, desatarem a falar em japonês entre eles deixando-nos a nós a olhar uns para os outros sem perceber patavina do que dizem. Por mais do que uma vez me apeteceu chamar-lhes a atenção para isso mas aguentei-me e acho que foi o melhor que fiz.

Fazem também uma coisa curiosa: trazem presentes e, nas reuniões, apenas dão presente à pessoa mais importante. Poderá ser ao presidente da empresa, a quem oferecem por exemplo uma requintada gravata de seda ou um objecto de valor, deixando a quem recebe incomodado por ser o único a receber um presente numa mesa em que sentam várias pessoas. Mas como gostam de sentir apreço, oferecem o presente e riem-se muito, felizes por sentir que agradaram. Já me vi nas duas situações, a de não receber nada e a de ser a única a receber, quando estava acompanhada de mais uma meia dúzia de colegas. Desconfortável. (Conservo em uso um grande lenço de seda lindíssimo, de uma macieza ao toque incomparável, com um design a um tempo moderno e tradicional, de facto intemporal, em tons predominantes cor de laranja sobre fundo branco mas com partes em diferentes tons de cinzento e em bege).

E queriam dar o meu nome a um produto e queriam tirar fotografias connosco e gostavam de ir jantar a sítios que sentissem que eram muito bons e nós sentíamos que estavam à espera que lhes proporcionássemos um acolhimento especial, em ambiente de grande hospitalidade. E riam-se sempre muito e agradeciam muito e estavam séculos a apertar-nos a mão.

Mas era com o Japão que se faziam os negócios de maior margem, de longe. Questionam por vezes alguns detalhes mas predispõem-se facilmente a pagar valores extraordinariamente altos.


Marrocos

Parceiros consistentes mas uma canseira. De cada pequena vez que se proporcionava, lá estavam eles a ver se conseguiam negociar qualquer coisinha extra e, sobretudo, com pompa e circunstância, a cada semestre, lá tínhamos grandes negociações que eram por escrito, por telefone (longos, longos, exaustivos telefonemas) e, finalmente, em pessoa. Tardes e tardes de negociação em que era mais o gosto obsessivo pela negociação do que outra coisa, e sempre tudo muito teatralizado mas com ar sofredor de quem estava a perder muito dinheiro, e que tinham que falar para o presidente e para o primo do rei e para o irmão do rei, ‘mais madame, mais madame, ce n’est pas possible, mais madame, ne demandez pas cela’, longas tardes, até à exaustão.

E depois tudo se concluía em bem, conforme à partida já se sabia.

E muito simpáticos, muito delicados, muito charmosos, todos com cursos superiores tirados na Europa, preferencialmente em Paris, claro.


Israel

Este mundo é um mundo de homens. Por norma, as reuniões são inteiramente masculinas (quando estou eu, sou geralmente a única mulher). O país em que me apareceram interlocutoras foi Israel. Em todos os casos mulheres bonitas, interessantes, muito femininas, muito bem arranjadas.

De todos os interlocutores, os israelitas foram talvez os mais temíveis.

Mesmo estas mulheres graciosas e elegantes eram, na verdade, duríssimas quando o tema era negócios.

Jogam forte e sustêm o jogo, fazem ultimatos e cumprem-nos à mínima hesitação da nossa parte. Reuniões com eles eram sempre reuniões que poderiam revestir-se de alguma tensão. Uma vez, com um deles, estivemos mesmo quase para suspender a reunião e convidá-lo a sair pois já estava a descambar para a agressividade descortês.

Por vezes, tendem a esquecer-se da regra de ouro dos negócios: um bom negócio é um negócio que é bom para ambas as partes. Se não jogarmos tão duro quanto eles, tendem a impor negócios leoninamente vantajosos para eles. E, mesmo depois de se chegar a acordo, acompanham a sua execução sempre com grande controlo e alguma desconfiança.


Noruega

Muito parecidos com os alemães. Impecáveis.

Alemanha

Em minha opinião os mais profissionais.

Trabalhei com pessoas de várias empresas, de várias regiões e a opinião que formei foi idêntica para todos eles. De uma objectividade, pragmatismo e rigor ímpares. Os relacionamentos profissionais mais sustentáveis, mais continuados, mais profícuos foram com alemães.

De uma forma muito natural, as coisas flúem com planeamento, com monitorização, com feed back. Tudo parece ocorrer sem esforço e tudo muito eficiente, sem um cálculo, uma palavra a mais do que é necessário. Mas cobrindo tudo o que é necessário para um entendimento perfeito da situação.

Nunca os ouvi queixarem-se de muito trabalho, nunca os vi cansados. Quando vinham cá, chegavam frescos ao meu gabinete, conversávamos, trabalhávamos, conversávamos e decorridas poucas horas tudo estava tratado em ambiente de total descontracção e dever cumprido. E falava-se de filhos, de cinema, do ambiente que se vivia em cada país e de hábitos e tudo muito friendly. E sempre tudo altamente eficaz, eficiente, sem burocracia, com simplicidade.

Todos os dias às 5 da tarde saíam, á 6ª feira à tarde não trabalhavam. E nunca senti qualquer sinal de arrogância, de prepotência. Muito pelo contrário: muito simpáticos, muito compreensivos, tentando perceber as dificuldades do outro lado, muito leais. Além disso, numa altura complexa, tive da parte de alemães as maiores demonstrações de verdadeira amizade.


(PS: Sobre a Argélia não me pronuncio, pode ser que a minha experiência não seja significativa. Mas foi desconcertante, constrangedor)

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